Dividido na política, mas integrado como território: imagine um Brasil bom de repente

Nas últimas oito eleições presidenciais do país, a polarização aumentou consideravelmente

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Foto: Freepik

É fato que o Brasil, politicamente, está dividido. Mas isso ocorre há muito tempo. Aliás, é por isso que podemos dizer que o país vivencia uma democracia.

Fazendo um recorte histórico, a partir do processo de redemocratização, é possível comprovar o quanto as urnas dimensionam a divisão política num país continental, de características culturais tão distintas.

E é necessário dizer: a livre escolha de se estar de um lado ou de outro, na polarização política que caracteriza as eleições brasileiras, é condição sine qua non para que a democracia se estabeleça.

Historicamente, os números corroboram a divisão política do país a partir de 1994 e até o pleito de 2022. Nas sucessivas eleições, o desempenho eleitoral de um lado e de outro foi ficando cada vez mais parelho. Em 1994, Fernando Henrique Cardoso (PSDB) venceu Lula (PT) com mais de 34,3 milhões de votos contra 17,1 milhões do petista, o que representa 54,28% e 27,04% do eleitorado Brasileiro, respectivamente.

As eleições seguintes seguiram mostrando a divisão política do país e expondo o quanto a disputa foi de tornando mais equilibrada.

 

Eleição de 1994 

FHC – Mais de 34 milhões de votos (54,28%)

Lula – Mais de 17 milhões de votos (27,04%)

 

Eleição de 1998 

FHC – Mais de 35 milhões de votos (53,06%)

Lula – Mais de 21 milhões de votos (31,71%)

 

Eleição de 2002 

Lula – Mais de 52 milhões de votos (61,27%)

José Serra – Mais de 33 milhões de votos (38,73%)

 

Eleição de 2006 

Lula – Mais de 58 milhões de votos (60,83%)

Geraldo Alckmin – Mais de 37 milhões de votos (39,17%)

 

Eleição de 2010 

Dilma Rousseff – Mais de 55 milhões de votos (56,05%)

José Serra – Mais de 43 milhões de votos (43,95%)

 

Eleição de 2014 

Dilma Rousseff – Mais de 54 milhões de votos (51,54%)

Aécio Neves – Mais de 51 milhões de votos (48,36%)

 

Eleição de 2018 

Jair Bolsonaro – Mais de 57 milhões de votos (55,13%)

Fernando Haddad – Mais de 47 milhões de votos (44,87%)

 

Eleição de 2022 

Lula – Mais de 60 milhões de votos (50,90%)

Jair Bolsonaro – Mais de 58 milhões de votos (49,10%)

 

O Dia do Nordestino, comemorado no domingo (8), sugere uma reflexão: se o Brasil na política está dividido, e o Nordeste fez e faz um contraponto relevante às opções do eleitorado das regiões Sul e Sudeste, a divisão territorial, como resultado de um movimento separatista, seria cabível? A resposta é não. Uma nação que se divide, em grave tensão social – o que não é o caso do Brasil –, se enfraquece no cada vez mais disputado espaço de poder da geopolítica internacional.

À década de 1980, a poesia de viés popular, cara à tradição cultural do repente nordestino, no canto alternado por dois cantadores, ganhou audiência na obra “Nordeste Independente”, assinada pelo paraibano Bráulio Tavares, nascido em Campina Grande (PB), e pelo pernambucano Ivanildo Vila Nova, filho de Caruaru. “Imagine o Brasil ser dividido e o Nordeste ficar independente” é o mote glosado.

Os dois artistas queriam defender um movimento separatista? Não. A obra fora nutrida pela fonte do nonsense, da irreverência, da visão utópica e bem-humorada. Seria, portanto, uma ‘boutade’ e não um texto panfletário em defesa de uma causa de guerra civil. E tanto é assim que o poema fala de uma divisão consensual:

 

“Já que existe a separação de fato,
é preciso torná-la de direito.
Quando um dia qualquer isso for feito,
todos dois vão vibrar, abertamente,
começando uma vida diferente,
de que a gente até hoje tem vivido.
Imagine o Brasil ser dividido
E o Nordeste ficar independente”

A obra enfatiza que a separação ocorreria sem contenda: “Separá-los, porém sem haver luta,/não precisa haver sangue na disputa,/ bastaria a separação somente”.

 

Bráulio: “Ninguém glosou o mote na hora”  

“Ninguém glosou o mote na hora; Ivanildo me trouxe, dias depois, algumas glosas manuscritas. Como o mote era bom, era rendoso, eu também fiz várias glosas. Passei a cantá-las com amigos, em mesas de bar, e por fim Elba Ramalho usou esses versos em shows e em disco. No disco ela canta seis estrofes, as quatro primeiras são de Ivanildo e as duas últimas são minhas. Mas há pelo menos umas 15 estrofes a mais, muitas delas gravadas pelo próprio Ivanildo em seus discos”.

 

Escute Ivanildo Vila Nova e Severino Feitosa glosando o mote.

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