O turismo, enfim, descobriu a mulher: a tese de 2025

O despertar institucional para o protagonismo feminino é louvável, mas levanta a questão: por que demorou tanto para enxergar o óbvio e o quão insuficientes são os "guias" e "descontos" diante do abismo da desigualdade e segurança?

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O Ministério do Turismo brasileiro, com o auxílio de estudos complexos como o ‘Os Sonhos Delas’, chegou a uma conclusão digna de uma epifania tardia: mulheres aspiram a sucesso profissional, liderança e independência financeira. Sim, pasmem. Essa “descoberta” fundamental agora serve de base para uma nova política setorial que, finalmente, pretende endereçar o fato de que a maior parte da força de trabalho e o motor de consumo do turismo há muito são impulsionados pelo gênero feminino.

Em um movimento de recuperação de um lapso temporal, a pasta anuncia que as políticas estão sendo “formuladas, conduzidas e implementadas” por mulheres, caracterizando um “protagonismo” que, na prática, muitas vezes se traduz na autogestão da própria luta. É um avanço conceitual notável, mas que reside sob a sombra da pergunta: por que o reconhecimento deste protagonismo não ocorreu organicamente nas últimas décadas? Por que foi necessária uma pesquisa para endossar a ambição feminina?

A intenção de garantir que a mulher viajante seja tratada com respeito, que agora se manifesta em um ‘Guia de Dicas para Atender Bem Turistas Mulheres’ (em parceria com a UNESCO), é reveladora. É um lembrete sutil, mas cáustico, de que a urbanidade e o senso comum não foram suficientes para erradicar a hostilidade, o desrespeito e a violência sexual, problemas que agora são abordados via aditivos ao Código de Conduta. É um esforço louvável, mas que expõe a precariedade de um setor que necessita de um manual para praticar o básico da civilidade.

Paralelamente, o mercado celebra um novo nicho rentável, o das viajantes solo. A inciativa de oferecer um desconto de 15% em hospedagens é apresentada como uma ação inovadora. É uma barganha, sem dúvida, pela ousadia de uma mulher que decide exercer sua liberdade de ir e vir desacompanhada em um país com sérios desafios de segurança pública e com uma “dívida histórica” declarada para com a valorização do feminino.

Viajar, para a mulher, ou para qualquer um, sempre foi um ato de conquista, autoafirmação e conexão consigo mesma. O mérito dessa jornada de transformação não é do guia ministerial, mas da persistência feminina em exigir um mundo onde a liberdade não seja condicionada à sorte ou a uma taxa de desconto promocional. A revolução do turismo será, de fato, feminina, mas ela se constrói na resiliência das ruas e nas malas, não apenas na retórica dos gabinetes e nas cartilhas. A estrutura é o que deve mudar, e não apenas o marketing do empoderamento.

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