João Pessoa foi palco, neste domingo (30), de um desfecho chocante no Parque Arruda Câmara (Bica): a morte de um jovem, conhecido como “Vaqueirinho”, após invadir a jaula de uma leoa. O acontecimento, que rapidamente dominou o noticiário paraibano, ganhou uma camada de profunda complexidade e tristeza com a divulgação de uma nota pela conselheira tutelar que acompanhou o caso por anos. O documento transforma o incidente de segurança pública em um pungente retrato da vulnerabilidade social.
O relato da conselheira, que esteve ao lado do garoto por cerca de oito anos, remonta a um cenário de abandono precoce. Aos dez anos, “Vaqueirinho” foi encontrado pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) à margem de uma estrada. Entregue ao Conselho Tutelar, sua vida foi marcada pela instabilidade e pela constante intervenção da Rede de Proteção. A dissolução do poder familiar, motivada pelos transtornos mentais da mãe, o colocou em um sistema onde ele se sentiu duplamente rejeitado.
Enquanto seus quatro irmãos foram encaminhados para a adoção, ele permaneceu à margem. A conselheira revela a frase cruel ouvida na instituição de acolhimento: “ninguém iria querer alguém como ele”. Essa visão desumanizada, porém, era rejeitada pela profissional, que insistia em enxergar no jovem uma criança em profundo sofrimento, e não a figura problemática que o acolhimento ou as redes sociais poderiam construir.
A nota detalha momentos extremos que sublinham o desespero de “Vaqueirinho”. Em um episódio dramático, ele tentou embarcar clandestinamente em uma aeronave no aeroporto, alegando que seu desejo era ir para um safári na África para “cuidar dos leões”. A intervenção das autoridades evitou uma tragédia aérea, mas sinalizou o quão longe ia a busca do jovem por um sentido e um refúgio.
Apesar da destituição familiar e da realidade desafiadora da mãe, o desejo mais profundo de “Vaqueirinho” era simples: retornar ao convívio materno. A narrativa da conselheira não apenas humaniza a vítima, mas também lança uma luz crítica sobre as falhas do sistema em oferecer uma rede de amparo efetiva, transformando uma criança abandonada em um jovem isolado.
O inquérito policial aponta para a suspeita de suicídio, conforme veículos de imprensa nacionais, uma hipótese que reforça o peso da angústia acumulada. Enquanto a leoa foi defendida por parte do público, que a isentou de culpa pela reação instintiva (claro), o drama de “Vaqueirinho” ressoa como uma denúncia silenciosa do preço da invisibilidade social e do estigma.
O caso, agora, se desdobra em uma investigação que precisa ir além da causa da morte, examinando a trilha de sofrimento que levou o jovem a buscar refúgio e, o fim, na jaula de um animal selvagem.





