A cada edição do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), o Brasil ganha um reality show bizarro em que a plateia, a juventude, opta por não assistir à estreia. Em um domingo de sol (e muita pressão), a prova de redação com o tema “Perspectivas acerca do envelhecimento na sociedade brasileira” funcionou como um espelho forçado, obrigando o jovem a confrontar o futuro que ele próprio vai herdar.
O Ministério da Educação (MEC) e o Inep acertaram no alvo, mirando um assunto de complexidade crescente, que extrapola a geriatria e invade a economia e o pacto social. Projeções oficiais do IBGE são taxativas: em breve, o país terá mais cidadãos de cabelos brancos do que de cadernos escolares, gerando uma pressão inédita sobre a Previdência Social e o sistema de saúde. O tema, portanto, é menos sobre idosos e mais sobre a conta que está chegando.
Enquanto o Brasil discute a longevidade, cerca de 27% dos inscritos no Enem, uma média de abstenção que teima em se manter estável ao longo das edições recentes, ignoraram o chamado.
Essa taxa de ausência é um sintoma de desinteresse ou de desesperança? Ela representa a parcela da juventude que, por logística, preparo insuficiente ou simplesmente descrença no sistema, se recusa a participar do ritual que, teoricamente, define o futuro. É o jovem que se ausenta do vestibular do país.
O índice, que se manteve próximo ao patamar do ano anterior (26,6%), não é apenas uma estatística burocrática; ele encerra uma ironia: enquanto o governo busca incentivar a presença com programas como o Pé-de-Meia, uma legião de candidatos prefere dar as costas ao um dos debates mais importantes da nação.
A pauta do envelhecimento abriu um vasto campo de reflexão, que inclui desde o combate ao etarismo, o preconceito contra a idade, um mal tão invisível quanto disseminado, até a necessidade urgente de uma política nacional de cuidados. Não se trata apenas de garantir aposentadoria, mas de repensar cidades, transportes, e, fundamentalmente, a forma como a sociedade valoriza e integra a experiência de quem já viveu mais.
O Enem, com sua tradicional carga de peso e significado, mais uma vez funcionou como a tribuna obrigatória para temas incômodos. A grande questão é saber se a sociedade, e, principalmente, a geração que fez a prova, terá a perspectiva de transformar o desafio demográfico em uma oportunidade de um futuro mais inclusivo e economicamente viável. Caso contrário, o país corre o risco de envelhecer de forma triste: numeroso em problemas e pobre em soluções.





