Câmara impulsiona tramitação na regulação do streaming e redefine o jogo do audiovisual no Brasil

Texto-base aprovado pressiona big techs, estimula produção nacional e cria nova dinâmica entre plataformas e salas de cinema.

Compartilhe o Post

A Câmara dos Deputados abriu um novo capítulo na relação entre plataformas de streaming e o mercado audiovisual brasileiro. Em sessão marcada por pressões de todos os lados, o plenário aprovou nesta terça-feira (4) o texto-base do projeto que estabelece regras para serviços de vídeo sob demanda no país. Foram 330 votos a favor e 118 contrários, resultado que pavimenta o caminho para a votação dos destaques, agendada para esta quarta-feira (5) pelo presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB).

O substitutivo elaborado pelo deputado Doutor Luizinho (PP-RJ) cria uma Condecine específica para o setor, com alíquota máxima de 4%, aplicada de forma escalonada, conforme o faturamento bruto das empresas, chegando ao teto para plataformas que ultrapassem R$ 350 milhões anuais. O desenho tributário, porém, não se limita à cobrança: até 60% da contribuição poderá ser deduzida, desde que revertida em investimentos no próprio ecossistema brasileiro. Isso inclui compra de direitos de obras independentes, produção própria realizada por produtoras registradas na Ancine e programas de formação profissional, estes últimos correspondendo de 1% a 3% do valor dedutível.

As chamadas big techs  serviços cujo catálogo depende do conteúdo publicado pelos usuários, ficam submetidas a uma alíquota muito inferior, de até 0,8%. Já as empresas de pequeno porte e plataformas com menos de 200 mil usuários brasileiros permanecem fora do alcance das novas exigências, exceto quando vinculadas a grupos estrangeiros.

Outro eixo central do texto é a ampliação da presença de produções brasileiras nos catálogos. As plataformas deverão reservar pelo menos 10% do acervo para obras nacionais, metade delas independentes. Quem já ultrapassa a marca de 700 títulos brasileiros, com pelo menos 50% independentes, fica dispensado da regra. Durante a tramitação, o relator ainda acolheu uma emenda que proíbe o uso de recursos da Condecine para financiar conteúdos pornográficos, um ponto que gerou pouco consenso, mas passou sem resistências significativas.

A medida que mais mobilizou o setor, porém, veio da proteção às salas de cinema. O projeto institui uma janela mínima de nove semanas entre o lançamento de um filme nos cinemas e sua chegada às plataformas. Na prática, trata-se de um respiro para as bilheterias, ameaçadas por décadas pelas mudanças de consumo e de um recado político: o cinema físico segue como peça estratégica na cadeia audiovisual nacional.

A oposição ao texto mirou principalmente o impacto potencial no bolso do consumidor. Críticos avaliam que novos tributos podem levar as plataformas a repassar custos, enquanto entidades de produtores independentes argumentaram justamente o contrário: para elas, faltou mais rigor na cobrança e mais estímulo à produção local. Nos últimos dias, profissionais do audiovisual ocuparam Brasília pedindo regras “menos tímidas”, defendendo que o país não pode perder a chance de fortalecer um setor que já responde por milhares de empregos.

Com a aprovação do texto-base, o debate entra agora em sua fase final na Câmara. E, embora ainda reste espaço para ajustes, uma coisa é certa: a era de autorregulação das plataformas está chegando ao fim, e o Brasil se prepara para redesenhar o território onde empresas globais e criadores locais disputam atenção e futuro.

Compartilhe o Post

Mais do Nordeste On.