Aos 80 anos, Mestra Têca de Oyá transforma tradição em som com lançamento de seu primeiro álbum

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Um canto antigo ganhou voz em estúdio. Aos 80 anos de idade, a sacerdotisa e mestra tradicional Têca de Oyá lançou seu primeiro álbum, intitulado Catimbó. O disco marca um momento inédito na trajetória de uma das mais respeitadas referências vivas da Jurema Sagrada e do Candomblé em Pernambuco.

O projeto é resultado de uma articulação entre Mestra Têca e a Casa das Matas do Reis Malunguinho, espaço dedicado à preservação e valorização das religiosidades afro-indígenas. Longe do mercado fonográfico convencional, o trabalho tem caráter documental e educativo, funcionando como registro sonoro de cantos e rezas transmitidos oralmente por gerações, muitos dos quais nunca haviam sido gravados.

Têca de Oyá, cujo nome de batismo é Maria José da Silva, atua há mais de seis décadas em rituais da Jurema e do Candomblé, especialmente no interior de Pernambuco. Seu terreiro é ponto de referência para estudiosos, devotos e lideranças tradicionais. Com o lançamento de Catimbó, a mestra firma também sua presença no universo da produção cultural, sem deslocar suas raízes da oralidade e do sagrado.

As faixas do álbum foram gravadas ao longo de meses de encontros em sua comunidade. Não há instrumentos ocidentais, nem harmonizações artificiais. Os registros seguem a estrutura dos toques e cantigas entoados nos rituais, com acompanhamento de maracás, agogôs e atabaques, preservando a cadência e a força original das práticas.

“É um documento para os que vêm depois, para que não se perca o que aprendi com os antigos”, declarou Mestra Têca durante o lançamento, que aconteceu de forma híbrida, com roda de conversa e exibição do álbum em plataformas digitais e em eventos presenciais em terreiros parceiros.

O álbum também tem função pedagógica. Será distribuído gratuitamente para escolas públicas e centros culturais ligados à educação antirracista e à valorização das culturas afro-brasileiras e indígenas. A proposta, segundo os organizadores, é “tirar os saberes da oralidade do risco do esquecimento, sem desrespeitar os limites que o sagrado impõe”.

A iniciativa surge num contexto em que as tradições da Jurema Sagrada enfrentam não apenas o preconceito histórico, mas também o desafio da transmissão num tempo marcado pela tecnologia e pela ruptura dos laços comunitários. Catimbó, nesse sentido, é mais que um álbum: é um gesto político, espiritual e histórico.

O lançamento conta com apoio da Lei Paulo Gustavo e integra uma série de ações de fortalecimento da memória viva dos povos tradicionais. Para quem quiser ouvir, Catimbó já está disponível nas principais plataformas de streaming. Para quem quiser entender, é preciso escutar com mais do que os ouvidos.

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