Alexandre Padilha captura Ministério da Saúde e controla cargos e verbas

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Em meio a uma das maiores epidemias de dengue da história do país, o Ministério da Saúde está no centro de uma disputa por áreas de influência e orçamentos bilionários.

Seis das oito secretarias estão sob influência de Alexandre Padilha, ministro das Relações Institucionais. Foi dele também a indicação de Nísia Trindade para o presidente Lula (PT), que buscava uma mulher para chefiar a pasta.

Ministro da Saúde entre 2011 e 2014 (governo Dilma), Padilha emplacou os nomes que dirigem as três principais secretarias, que cuidam de R$ 149 bilhões —quase 70% da verba própria do ministério.

São eles Alexandre Massuda (responde pelo Samu, UPAs, policlínicas, centros de referência, hospitais, oncologia); Felipe Proenço de Oliveira (UBS e programas Brasil Sorridente, Mais Médicos e Consultório na Rua) e Carlos Gadelha (medicamentos de alto custo, Farmácia Popular e relação com as indústrias farmacêutica e hospitalar).

No levantamento feito pelo UOL, 13 nomes, somente nos primeiro e segundo escalões, são vinculados a Padilha. Eles manejam, no total, um orçamento de R$ 169,5 bilhões —80% de toda a verba da pasta.

O centrão, liderado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PL-AL), trava uma disputa com o governo por verbas da Saúde, cuja distribuição privilegia prefeituras de petistas e de aliados.

Nas últimas duas semanas, a reportagem ouviu mais de dez fontes que atuam ou atuaram no ministério, além de dirigentes do PT, deputados e senadores do PT e do centrão.

Até dentro do PT é dito que, na prática, Padilha comanda dois ministérios.

Alexandre Padilha, em nota enviada à reportagem, afirmou que “não fez nenhuma das indicações citadas para a composição atual do Ministério da Saúde e nem sequer conhece pessoalmente alguns dos nomes citados”.

Também procurado, o Ministério da Saúde disse, em nota, que “todas as contratações são baseadas nas experiências e trajetórias do profissional em relação aos temas de suas respectivas secretarias”.

O indicado de Lula
A queda de braço envolvendo indicações políticas e correntes do PT revela a falta de autonomia da ministra Nísia Trindade. São os figurões do partido que dão as cartas na pasta.

Nísia não escolheu sequer o seu subordinado direto. A contratação de Swedenberger Barbosa para secretário-executivo foi uma demanda de Lula.

Ele é um dos poucos “subministros” com quem Lula fala diretamente, com uma liberdade que não tem com a titular da vaga.

Ligado diretamente a Lula, com quem trabalhou nos dois primeiros governos do petista, Swedenberger (ou “Berger”) Barbosa é responsável por fazer a máquina andar e cobrar resultados das secretarias.

Também é ele quem monitora a execução do orçamento —da verba própria às emendas parlamentares.

Em 2023, a pasta deixou pela primeira vez R$ 32 bilhões do orçamento em “restos a pagar”, a serem executados em 2024 —R$ 5 bilhões a mais do que deixou o governo anterior. Os dados são da Secretaria do Tesouro Nacional.

A responsabilidade pela paralisia no Congresso é creditada mais a Berger do que à própria ministra, mas é ela quem recebe as críticas do presidente, do centrão e do PT.

Lula expôs Nísia, em reunião ministerial no início de março, ao condenar a gestão na Saúde, e poupou Berger e seu partido do ataque público.

Embora Lula afirme que entregou a Saúde para um quadro técnico, ao menos 16 cargos de comando estão nas mãos do PT ou de militantes do partido, que preenchem suas áreas com colegas da sigla. Nísia, que não tem filiação partidária, é uma exceção.

As divergências nas correntes do PT se reproduzem nos gabinetes do ministério. A disputa por espaço alimenta o “fogo amigo” que atinge a ministra em grupos de WhatsApp.

A pasta foi fatiada entre os movimentos CNB (Construindo um Novo Brasil), Democracia Socialista e o Movimento Popular Brasil, grupo que agrega MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra); Levante Popular da Juventude; MMC (Movimento de Mulheres Camponesas); e MTD (Movimento de Trabalhadores e Trabalhadoras por Diretos).

Em 15 de março, o secretário de Atenção Primária, Felipe Proenço de Oliveira, postou uma foto nas redes sociais estendendo a bandeira do Movimento Popular Brasil, dentro da sua sala no ministério.

Neste ano, Proenço tem um orçamento de R$ 43 bilhões —praticamente o que a cidade do Rio dispõe para todas as áreas (R$ 45,7 bilhões). A esposa dele trabalha na assessoria de Padilha no Palácio do Planalto.

Centrão
O “centrão raiz”, formado por PP, PL e Republicanos, contribui para incendiar a crise, mas seus líderes admitem que o PT se enraizou na pasta, o que torna impossível a troca.

Após o desastre do governo Bolsonaro na gestão da pandemia da covid-19, o ministério ganhou ainda mais relevância como contraponto ao governo anterior.

Lula, contudo, enfrenta uma das maiores epidemias de dengue da história. Virou o “presidengue” nas redes da oposição bolsonarista, o que tem gerado um desgaste na imagem do governo.

O centrão partiu para cima da ministra quando a pasta decidiu privilegiar o PT na distribuição de verbas em áreas de alta e média complexidades (cirurgias e equipamentos de hospitais).

A explicação do ministério — de que bloqueou o que havia batido no teto estabelecido para o envio dos recursos — não colou.

Com uma equipe de técnicos experientes, o centrão descobriu rapidamente que os quatro prefeitos do PT de São Paulo (Matão, Araraquara, Diadema e Mauá), por exemplo, receberam mais que o dobro do previsto.

O próprio Arthur Lira (PP-AL) mandou requerimento para a ministra cobrando explicações. Ele apresentou o pedido em 6 de fevereiro e, no mesmo dia, foi aprovado.

A ministra só respondeu um mês depois, no dia 7 de março, o que deixou Lira furioso e fez com que tivessem uma conversa pouco amigável ao telefone.

Para o centrão, o problema é a verba represada e a tentativa da trinca Padilha-Berger-Rui Costa (ministro da Casa Civil), todos do PT, de tentarem escantear a Câmara na divisão dos recursos.

Quando ataca a ministra, o grupo mira em Padilha.

Na concentração
O PT tem três nomes para substituir Nísia: o próprio Padilha, o ex-ministro Humberto Costa e Adriano Massuda.

Massuda é ligado a Padilha. Ninguém duvida que o petista é o plano B do ministro para a vaga numa eventual queda da ministra.

A secretaria era ocupada por Helvécio Miranda Magalhães Júnior até meados de março.

Também do PT e do grupo de Padilha, ele foi demitido após o “Fantástico” (TV Globo) revelar a situação de hospitais federais no Rio e divulgar um vídeo de uma reunião da sócia da empresa Potenza Soluções Prediais e Facilities, Grasielle Esposito, com um diretor do hospital de Bonsucesso, no qual ela dizia falar em nome do secretário.

Os hospitais federais do Rio são loteados entre os deputados Lindbergh Farias, Benedita da Silva, Dimas Gadelha e Washington Quaquá.

Por causa disso, a queda de Helvécio é creditada a “fogo amigo”.

Outro lado
Em nota, Alexandre Padilha negou que tenha feito as indicações citadas.

“Como era de se esperar pela sua experiência como cientista e gestora da maior instituição de saúde pública brasileira, a ministra Nísia Trindade montou sua equipe com quadros reconhecidos da saúde pública, experientes em outras gestões em vários níveis do SUS, entre elas pessoas que estavam no Ministério da Saúde entre 2011 e 2014.”, afirmou.

Para o ministro, vincular a ele indicações na Saúde é machismo.

“Há um forte componente machista nessa imagem que tentam construir de que a ministra Nísia, cientista renomada e ex-presidente da mais tradicional instituição da saúde pública brasileira, não tenha montado sua equipe com autonomia necessária e necessite de qualquer tipo de tutela para conduzir sua gestão à frente do Ministério da Saúde.”

Sobre suas atribuições, Swedenberger Barbosa disse que “busca sempre atender rapidamente ao comando da ministra seguindo os fluxos que norteiam a gestão, dentro da conformidade administrativa e em alinhamento com os órgãos de controle”.

“Nunca houve qualquer ação protelatória em relação ao Congresso. Ao contrário, nosso interesse é dar celeridade ao atendimento das demandas o mais rapidamente possível. Para o atendimento das demandas, estão envolvidos o Gabinete Ministerial, a Assessoria Parlamentar, as Secretarias Finalísticas e finalmente a Secretaria Executiva”, acrescentou Swedenberger.

Procurada, a ministra Nísia Trindade não se manifestou.

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