Punição e consentimento: a Itália aprova prisão perpétua para casos de feminicídio

​Prisão Perpétua e "Lei do Sim": O país da Dolce Vita tenta equilibrar a balança da justiça de gênero. A vergonha brasileira, com seu recorde macabro, é o constrangimento comparativo da vez.

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Enquanto a Itália, berço do direito romano e da moda, se move com passos pesados mas firmes, fica a pergunta: será que a legislação pode, sozinha, apagar séculos de misoginia estrutural? Recentemente, o país deu dois “salve-se quem puder” em seu Código Penal.

Primeiro, veio o reconhecimento do feminicídio com a ameaça de prisão perpétua. A aprovação, por unanimidade na Câmara dos Deputados em 25 de novembro, Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra as Mulheres, e a espera pela sanção presidencial, parecem dizer: “Sim, sabemos que matar mulheres por serem mulheres é um problema crônico e inaceitável”.

A iniciativa não é aleatória, surge em meio a debates acalorados sobre a violência de gênero, um cenário que, infelizmente, ecoa em terras mais ao sul. A taxa de feminicídio italiana registrada pelo Istat em 2023 foi de 0,31 por 100 mil mulheres. O número é baixo, mas alto o suficiente para gerar uma comoção histórica, especialmente após casos chocantes que dominaram o noticiário. ​Aí, a comparação vira um soco no estômago tupiniquim.

O Espelho Quebrado do Brasil

O Brasil, com sua taxa nacional de feminicídio em 2023 chegando a 1,4 por 100 mil mulheres, conforme dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, assiste à movimentação italiana com a vergonha de quem é pego no flagra. O nosso índice, mais de quatro vezes maior, revela que a tipificação do crime por aqui, em 2015, ainda não foi o antídoto esperado, parecendo mais uma pomada para um ferimento grave.

Enquanto isso, os italianos engataram a segunda marcha: a chamada “Lei do Consentimento”.

O Óbvio Ululante e a Lei do “Sim”

Na mesma semana da aprovação do feminicídio, a Câmara italiana abraçou uma reforma que parece um desabafo de bom senso: redefinir estupro para incluir a necessidade de consentimento explícito para relações sexuais. Até então, a legislação exigia o clássico menu de coação física, ameaça ou abuso de autoridade.

Ora, é preciso desenhar que “não é não” e, mais que isso, que a ausência de um “sim” vocalizado, entusiástico e revogável, é, sim, violação? A nova abordagem, que ainda aguarda o crivo do Senado, tenta, enfim, tirar o foco da vítima para colocá-lo onde sempre deveria estar: no agressor.

Resta saber se a caneta do presidente Sergio Mattarella e a aprovação final do Senado conseguirão traduzir o progresso legislativo em uma real mudança cultural. Porque, no final das contas, nenhuma pena perpétua ou definição de consentimento consegue ressuscitar quem foi silenciada ou apagar o trauma de quem sobreviveu. Mas é um começo. E, olhando para a nossa própria casa, a lição é clara: não basta ter a lei, é preciso ter a vergonha na cara para fazê-la funcionar.

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