A máxima “o show tem que continuar” ganha um tom de ironia cáustica em Santos, no lar batizado em homenagem ao pai de Pelé, o saudoso Dondinho.
No Condomínio Residencial Dondinho, onde repousam em espólio dois apartamentos que pertenceram ao Atleta do Século, a eternidade da glória parece não imunizar contra a rotina prosaica dos boletos. A Justiça de Santos, implacável em sua missão cartorial, determinou a penhora dos direitos sobre os imóveis, tudo por causa de uma dívida de cotas condominiais que, somada, beira a bagatela de R$ 9 mil.
O valor, irrisório se comparado ao patrimônio do Rei, refere-se aos atrasos de abril a junho de 2024. É a prova cabal de que, mesmo após o último suspiro, o legado de um ícone mundial ainda precisa enfrentar o síndico. A decisão de penhorar os direitos, e não os bens em si, já que o inventário, a saga Game of Thrones da vida real, segue em aberto, garante o pagamento sem o risco de a família perder o teto de cimento e glória.
A cena é digna de uma tragicomédia moderna: o maior jogador de futebol de todos os tempos, o embaixador do Brasil no mundo, sendo cobrado judicialmente por um débito que mal pagaria um par de chuteiras de grife. Enquanto os herdeiros discutem a divisão da herança, que inclui imóveis suntuosos e outros processos de cobrança, o Dondinho espera, na Avenida Almirante Cochrane, que a fatura seja honrada.
É fascinante observar como a máquina burocrática, cega a títulos e troféus, iguala o Rei à plebe. A Justiça demonstra seu mais puro sarcasmo: a dívida pode ser pífia para um espólio milionário, mas a cobrança é solenemente protocolada. Afinal, a camisa 10 da Seleção Brasileira vale muito, mas no hall do condomínio, o que manda é o carimbo do comprovante. O Rei nunca teve adversários à altura no campo, mas fora dele, o débito automático mostra que até mesmo a imortalidade tem seu preço e seu prazo de vencimento.
