Em tempos de redes sociais dominadas por algoritmos impiedosos e um marasmo criativo sem precedentes, o canadense Cory Doctorow, passado e presente guerreiro pela “enshitificação” da internet, lança luz sobre o naufrágio da nossa tão adorada rede mundial. Doctorow não apenas cunhou o termo que sintetiza a degradação digital, mas agora aponta onde e por que as grandes empresas do Vale do Silício foram de salvadoras da informação a algozes do usuário.
Não é segredo que a internet hoje funciona como uma praça de mercado onde se vende de tudo, menos dignidade e liberdade. O que antes era um espaço vibrante para o compartilhamento aberto se tornou uma arena de manipulação por plataformas que apostam na saturação, no sensacionalismo e, principalmente, em dinheiro, muito dinheiro.
Doctorow descreve um ciclo vicioso: a necessidade das big techs de maximizar o tempo de tela e o engajamento leva à inflação da quantidade e à queda brutal da qualidade. Isso explica a avalanche de conteúdos ralos, notícias falsas e anúncios invasivos com que somos bombardeados. A cada clique, a cada scroll, o usuário paga em exposição e paciência, enquanto os cofres dessas corporações se enchem.
Mas a grande ironia é que, ainda que dominem o espaço digital com seus algoritmos e estratégias obscuras, as próprias empresas não oferecem mais o que deveriam: uma experiência online menos poluída e mais útil. Doctorow é claro ao condenar o modelo que transforma usuários em produtos, vendendo suas atenções ao maior lance, em uma corrida enlouquecida contra a decência e a clareza.
A saída? Questionar, resistir e buscar alternativas reais. Porque, enquanto as big techs apostam na banalização e na “merdificação”, quem perde é o senso crítico e a própria inteligência digital da sociedade.
Se as nossas plataformas estão cada vez mais parecidas com mercados de troca de ilusões, não resta muito espaço para a ingenuidade. A fórmula do lucro fácil virou um jogo sujo, e a internet como um espaço democrático está à venda, ou pelo menos é o que dizem as mensagens subliminares que não param de pipocar em nossas timelines.
Está na hora de parar de comprar a mercadoria estragada e exigir um produto à altura da nossa curiosidade e da nossa inteligência. Porque, se Internet é informação, transparência e liberdade, as big techs deram com tudo no muro da mesmice e do cinismo corporativo. E pelo jeito, não querem sair de lá tão cedo.