Uma nova perspectiva sobre um dos sintomas mais enigmáticos da esquizofrenia, o ato de “ouvir vozes”, emerge de um estudo recente liderado por psicólogos da Universidade de Nova Gales do Sul (UNSW). A pesquisa aponta que as alucinações verbais em pacientes podem ser resultado de uma incapacidade do cérebro de reconhecer a sua própria fala interna.
O professor Thomas Whitford, da Escola de Psicologia da UNSW, autor do estudo publicado no periódico PLOS Biology, explica que a “fala interna” é um fenômeno comum, silencioso e involuntário que narra os pensamentos, percepções e planos do dia a dia. Para a maioria das pessoas, essa voz na cabeça é inequivocamente reconhecida como originária do próprio indivíduo.
A falha no reconhecimento dessa voz silenciosa é o ponto central da nova hipótese. Segundo o estudo, as alucinações auditivas verbais, a percepção de vozes sem que haja um estímulo sonoro externo, surgiriam de uma complexa interação prejudicada entre os sistemas motor e sensorial do cérebro.
O mecanismo cerebral que normalmente previne a confusão entre o pensamento interno e a audição real é conhecido por gerar um tipo de sinal inibitório. Este sinal atua como um “corretor de erros”, informando ao córtex auditivo que o som que está sendo processado é, na verdade, uma autogeração, seja ela falada em voz alta ou apenas pensada.
No contexto da esquizofrenia e das alucinações verbais, os achados da UNSW indicam uma quebra nessa inibição. A pesquisa sugere que o cérebro do paciente não aplica o amortecedor neural necessário, o que o leva a interpretar a sua própria fala interna, ou a imagem mental do discurso, como se fosse uma voz vinda de fora, de uma fonte externa.
Essa deficiência em distinguir o que é fantasia da realidade pode não só explicar a origem das vozes, mas também o seu conteúdo. Enquanto uma falha na inibição explica a percepção das vozes como externas, a imprecisão na forma como a informação é aprimorada no cérebro pode ser responsável pelo conteúdo variado e, por vezes, sem sentido ou perturbador que acompanha as alucinações, conforme apontam as descobertas.
O entendimento mais claro do mecanismo neural por trás deste sintoma, que afeta cerca de 75% dos pacientes com esquizofrenia, pode pavimentar o caminho para abordagens terapêuticas mais direcionadas. Em vez de apenas tratar a manifestação psicótica, os tratamentos futuros poderiam focar no reestabelecimento da funcionalidade da rede neural que diferencia a autoria do pensamento e da audição, oferecendo novas esperanças para o controle das alucinações.





