​O SUS como patrimônio particular: o esquema que financiou o luxo na Saúde de Alagoas

​Sob a sombra de uma organização criminosa que movimentou R$ 100 milhões, o ex-secretário Gustavo Pontes Miranda é alvo da Polícia Federal por converter verba pública em imóveis para sua vida paralela.

Compartilhe o Post

A fronteira entre o dinheiro público destinado à saúde e os interesses privados parece ter se dissolvido na Secretaria de Saúde de Alagoas (Sesau). Um inquérito da Polícia Federal (PF) expõe agora as engrenagens de um esquema que não apenas sangrou os cofres do estado em mais de R$ 100 milhões, mas também serviu de alicerce para a construção de um patrimônio imobiliário de luxo em nome de terceiros.

No centro do escândalo está o médico Gustavo Pontes Miranda, recentemente afastado do cargo de secretário de Saúde por determinação do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5). Segundo as investigações, Miranda comandava uma estrutura sofisticada de fraude em contratações públicas. O destino de parte desses recursos, no entanto, revela um roteiro de ostentação que foge aos protocolos administrativos: a compra de propriedades de alto padrão para Andreia Araújo Cavalcante, identificada pelos investigadores como sua amante.

A PF detalha uma dinâmica de “intimidade financeira” que mimetizava uma união estável. Andreia, proprietária de uma pequena loja de roupas em Brasília com capital social de apenas R$ 5 mil, viu sua movimentação bancária saltar para quase R$ 5 milhões em pouco mais de um ano e meio, valor que ignora solenemente as declarações feitas à Receita Federal.

​O contraste entre a realidade fiscal e a vida real é gritante. Em julho de 2023, Andreia assinou a compra de uma casa de luxo na capital federal por R$ 1,69 milhão. O lastro financeiro para a aquisição, contudo, não veio de seu comércio, mas de uma “confissão de dívida” assinada pelo próprio Gustavo Miranda, na qual o então secretário assumia a responsabilidade pelas parcelas do imóvel, com quitação prevista para este ano.

A lista de bens sob suspeita estende-se ao litoral alagoano. Documentos em posse da PF indicam que Andreia também adquiriu um flat à beira-mar no bairro de Cruz das Almas, em Maceió, avaliado em R$ 797 mil. Para os investigadores, a tese de que os imóveis seriam frutos do trabalho da empresária é insustentável: entre janeiro de 2023 e agosto de 2024, sua loja realizou remessas de apenas R$ 8,4 mil, reforçando o indício de que a empresa servia apenas como fachada ou era irrelevante para o padrão de vida mantido pelo casal.

O caso agora avança para a fase de análise de quebra de sigilos e perícia de documentos apreendidos. Enquanto a defesa dos envolvidos ainda não se manifestou detalhadamente sobre o teor das acusações, os dados apresentados pela Polícia Federal desenham um cenário onde a saúde pública de Alagoas foi utilizada como balcão de negócios para sustentar uma vida de opulência, longe dos olhos do contribuinte e dos registros oficiais.

Compartilhe o Post

Mais do Nordeste On.