Desde que a Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC) começou a formalizar o exercício da profissão em 1948, mais de 9 mil nomes preencheram suas listas de egressos. No entanto, foi necessária a passagem de quase 80 anos para que essa cronologia abraçasse a identidade quilombola. No dia 8 deste mês, ao assinar a ata de colação de grau, Diogo Augusto de Araújo dos Santos, de 24 anos, não apenas encerrou um ciclo acadêmico, mas interrompeu um isolamento histórico.
Natural da Comunidade Quilombola Serra da Rajada, em Caucaia, Diogo emerge de uma realidade onde o acesso ao ensino superior ainda é a exceção da regra. No Ceará, o abismo educacional é palpável: dados do Censo apontam que um em cada quatro adultos em territórios quilombolas é analfabeto, uma estatística que o próprio pai de Diogo personificou no passado.
A trajetória do jovem médico foi viabilizada pela Lei de Cotas, um mecanismo de reparação que, embora consolidado na legislação brasileira, ainda enfrenta o desafio da permanência estudantil. Para Diogo, a vaga conquistada há cinco anos foi o ponto de partida para um embate contra o determinismo social. Sua graduação é um dado disruptivo em um sistema de saúde que raramente vê, no lado de cá do estetoscópio, rostos que representam as comunidades tradicionais do semiárido.
A conquista em Caucaia, especificamente no distrito de Tucunduba, reverbera como um marco de representatividade política e social. O novo médico agora carrega a responsabilidade de ser a prova viva de que a excelência acadêmica não está restrita a CEPs privilegiados, mas depende, fundamentalmente, de políticas de acesso que consigam atravessar décadas de invisibilidade.





