24 de novembro, Dia do Rio, o ralo visível da água potável: O desperdício que afoga

Infraestrutura defasada e rios contaminados: o retrato do desperdício que compromete a segurança hídrica nacional.

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​O Brasil detém uma das maiores reservas de água doce do planeta, mas ironicamente, uma ineficiência colossal na sua distribuição transforma essa abundância em escassez e poluição. Cerca de 40% de toda água potável tratada e captada em mananciais simplesmente desaparece antes de chegar às torneiras, um volume que, anualmente, seria suficiente para abastecer mais de 50 milhões de pessoas.

​Em um cenário de crise climática e recursos hídricos sob pressão, a média nacional de perda, que em regiões como Norte e Nordeste ultrapassa a marca dos 50%, é um atestado da urgência de investimento em saneamento. Apesar de uma ligeira queda no índice de perda de distribuição em 2022 (37,8%), o país patina longe da meta de 25% estipulada pelo Ministério do Desenvolvimento Regional.

 

As causas desse “ralo invisível” são estruturais e multifacetadas, refletindo décadas de descaso e falta de investimento:

● Infraestrutura em Colapso: A principal vilã é a perda física, resultado de vazamentos em tubulações antigas e na ausência crônica de manutenção.

● Perdas Não Físicas: Uma parte significativa é a perda aparente, impulsionada por fraudes, ligações clandestinas (“gatos”) e falhas grotescas na medição do consumo.

● A Ausência de Prioridade: A modernização dos sistemas de saneamento básico segue a passos lentos, com poucos recursos direcionados para a substituição de redes e a implementação de tecnologias mais eficientes de controle de pressão e detecção de vazamentos.

Enquanto milhões de litros de água tratada se perdem no subsolo, a negligência com o saneamento destrói a própria fonte da vida: os rios. Muitos cursos d’água que já foram vitais para o desenvolvimento e o lazer das cidades se transformaram em canais de esgoto a céu aberto, resultado do baixo índice de coleta e tratamento.

 

O Rio Tietê, em São Paulo, e o Rio Iguaçu, no Paraná, são exemplos notórios dessa tragédia hídrica. O Tietê, por exemplo, recebe uma carga gigantesca de esgoto doméstico e industrial, com 19 dos 34 municípios da Região Metropolitana de São Paulo ainda despejando esgoto in natura em seus afluentes. O Atlas Esgotos da Agência Nacional de Águas (ANA) é alarmante: mais de 110 mil km de rios brasileiros já apresentam a qualidade da água comprometida por excesso de carga orgânica.

Essa contaminação não só inviabiliza o uso da água para consumo, exigindo tratamentos cada vez mais caros e complexos para as prestadoras de serviço, como também degrada ecossistemas inteiros e eleva os riscos de saúde pública.

No Dia Nacional do Rio, celebrado em 24 de novembro, a reflexão sobre o descaso ganha um peso ainda maior. A data serve para alertar que a preservação dos rios está diretamente ligada à segurança hídrica e à qualidade de vida da população. É inadmissível que, em pleno século XXI, o país continue desperdiçando um volume de água capaz de saciar a sede de um quinto de sua população, enquanto condena suas artérias fluviais a uma morte lenta e fedorenta.

A solução exige mais do que apenas planos e metas: requer um choque de investimento, fiscalização rigorosa contra as perdas e fraudes, e uma mudança de mentalidade que trate a água e o saneamento como prioridades estratégicas, e não como um luxo adiável.

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