Se Hollywood tem o Batman, cujos intérpretes se revezam em uma dança eterna de aprovação e cancelamento, o Brasil consolidou seu próprio mito inalcançável: Silvio Santos. Mal tivemos tempo de processar o luto nacional de agosto de 2024 ou de digerir a estética questionável de “Silvio” (o longa protagonizado por Rodrigo Faro), e eis que o cinema brasileiro, nessa incansável máquina de reciclar ícones, nos serve uma nova fatia do bolo. Desta vez, a cereja, ou melhor, a peruca, cabe a Leandro Hassum.

O filme em questão, “Silvio Santos Vem Aí”, que aporta nos cinemas sob a batuta de Cris D’Amato, promete uma abordagem que oscila entre a ousadia narrativa e o delírio criativo. Esqueça o sequestro dramático do filme anterior. O roteiro de Paulo Cursino decide mergulhar no fatídico ano de 1989, aquele momento singular em que o apresentador quase trocou o auditório pelo Palácio do Planalto.
Mas aqui reside a verdadeira “pegadinha do Mallandro”: a trama não se contenta com a biografia pura. Ela insere Manu Gavassi como uma repórter-espiã, enviada por adversários políticos para desenterrar os esqueletos do Patrão. Uma premissa que, convenhamos, soa como uma fanfic de alta qualidade escrita durante uma madrugada de insônia nos corredores da Anhanguera. A dinâmica proposta é clássica: a inquisidora que chega para destruir o mito e acaba seduzida pelo carisma do homem por trás da lenda.

Hassum, conhecido nacionalmente por seu humor expansivo e decibéis elevados, jura de pés juntos que deixou sua “fera interior” descansar. O ator afirma buscar o “Senor” e não apenas a caricatura do “Silvio”. É um desafio shakespeariano para o humorista: conter os trejeitos que o consagraram em “Até que a Sorte nos Separe” para encarnar a sutileza de um gênio da comunicação que sabia exatamente quando ser povo e quando ser empresário.
O elenco de apoio traz Regiane Alves como a matriarca Íris Abravanel, além de figuras carimbadas como Marcelo Laham e Gabriel Godoy, compondo esse cenário que mistura nostalgia e ficção. A direção de D’Amato, vinda de sucessos de bilheteria como “S.O.S. Mulheres ao Mar”, sugere um produto final com verniz pop, focado no entretenimento, mas com a perigosa missão de não transformar a história política do país em uma esquete de domingo.

O que fica claro, observando este novo lançamento, é que a figura de Silvio Santos transcendeu a realidade para se tornar um gênero cinematográfico autônomo. Estamos vivendo a era do “Silvioverso”. Resta saber se Hassum conseguirá o que parece impossível: fazer o público rir e se emocionar sem que a sombra dos memes de internet, ou a memória recente da performance de Faro, ofusque o brilho do verdadeiro Dono do Baú.
Quem quer dinheiro? O cinema nacional, certamente, quer. E a aposta em Silvio continua sendo a mais alta da mesa.





