O palco da Cúpula do Clima em Belém, às vésperas da COP30, transformou-se na voz de apelo mais contundente do Sul Global. Em sua intervenção na sessão temática desta sexta-feira (7), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva confrontou a inércia global diante da crise climática, marcando o décimo aniversário do Acordo de Paris não com celebração, mas com um severo diagnóstico de insuficiência.
Lula dirigiu-se aos líderes mundiais com uma pergunta direta: “Estamos realmente fazendo o melhor possível?”. A resposta, ressoada pelos dados científicos, é negativa. Ele lembrou que, apesar dos compromissos nacionais (NDCs) de mais de cem países, o planeta ainda é empurrado para um aquecimento próximo de 2,5°C. Relatórios recentes da Organização das Nações Unidas (ONU) e do PNUMA confirmam este grave déficit de ambição, sublinhando que as promessas atuais não são suficientes para ancorar o aumento da temperatura em 1,5° C.
O chefe de Estado brasileiro sublinhou a profunda injustiça climática. Enquanto o Norte industrializado historicamente impulsionou a crise, são os territórios do Sul Global, regiões da África, Ásia e América Latina, que enfrentam a iminência de se tornarem inabitáveis. A vulnerabilidade de ilhas no Caribe e no Pacífico, ameaçadas pela elevação do nível dos oceanos, foi citada como a prova cabal: “Omitir-se é sentenciar novamente aqueles que já são os condenados da Terra”.
Para preencher a “lacuna entre a retórica e a realidade”, o Brasil defendeu uma reformulação radical do modelo de financiamento climático. Lula criticou a dinâmica do “financiamento reverso”, onde a maioria dos recursos chega ao Sul Global na forma de empréstimos, forçando nações em desenvolvimento a pagar juros para combater um problema que não criaram. Ele defendeu que a ação climática seja enquadrada como investimento, e não como mero gasto, citando os instrumentos de troca de dívida por ações ambientais como uma alternativa viável.
O Mapa do Caminho Baku-Belém, que busca traçar alternativas para alcançar a meta de US$ 1,3 trilhão anual para mitigação e adaptação, ganha tração com a proposta audaciosa de taxar os ultrarricos. O presidente reiterou que a vasta concentração de riqueza nas últimas quatro décadas coincide com a redução dos orçamentos públicos. Baseado em dados de que o 0,1\% mais rico emite em um dia mais carbono do que metade da população mundial em um ano, o apelo é ético e pragmático. A taxação de corporações multinacionais e grandes fortunas, uma iniciativa que o Brasil tem articulado em coalizão com países como Espanha e África do Sul, emerge como uma fonte fundamental e justa para financiar a transição energética global.
Guardiões da Terra e Multilateralismo
No âmbito interno, o Brasil propõe que a futura COP30 reconheça formalmente o papel dos territórios e políticas de proteção das comunidades indígenas e povos tradicionais como instrumentos de mitigação. Trata-se de uma valorização da sabedoria ancestral no manejo florestal, essencial para a conservação da Amazônia.
Ao encerrar seu discurso, Lula fez uma defesa enfática da cooperação internacional, instando os líderes a revitalizarem o Acordo de Paris por meio de Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) mais ambiciosas. “Não existe solução para o planeta fora do multilateralismo”, declarou, reiterando que a resposta à crise climática deve ser única e coletiva, uma pré-condição para a construção de uma nova era de prosperidade equitativa. Belém, com sua Cúpula, estabeleceu o tom de urgência e a necessidade de medidas adicionais concretas, desafiando a comunidade internacional a agir antes que o ponto de não retorno seja alcançado.





