Os pombos urbanos (Columba livia), figuras comuns nas grandes cidades ao redor do mundo, frequentemente são alvo de críticas devido à sua associação com a sujeira e ambientes insalubres. No entanto, esse estigma nem sempre corresponde à realidade biológica dos animais, como revelam especialistas em biologia e ecologia urbana.
Nativos de regiões da Europa, Ásia, África e Oriente Médio, os pombos foram amplamente dispersos durante as grandes guerras, servindo não apenas como pombos-correio, mas também como fontes de alimentação. Sua adaptação a diferentes ambientes urbanos fez com que se tornassem uma presença constante em locais movimentados, como praças, parques e ruas de cidades ao redor do mundo. Contudo, sua convivência próxima ao lixo e sua busca constante por restos de alimentos em áreas públicas reforçam a imagem de que são animais sujos e transmissores de doenças.
“Apesar de estarmos frequentemente expostos à imagem dos pombos nas ruas e a associá-los a ambientes insalubres, o estigma de ‘animal impuro’ é mais uma construção social do que um reflexo de sua biologia”, defende Eduarda Pelizzari Camilo, professora de ciências biológicas no Colégio Católica Curitiba (PR). A especialista destaca que o medo e a aversão a esses animais surgem principalmente de questões estéticas e sanitárias, uma vez que são comumente vistos em locais com alto índice de sujeira e decomposição.
Fabrício Escarlate, biólogo e professor do Centro Universitário de Brasília (CEUB), complementa a análise, afirmando que embora o estigma de “ratos com asas” seja popularmente exagerado, ele contém elementos de verdade. “Os pombos ocupam nichos urbanos muito semelhantes aos dos ratos, como áreas de grande circulação e espaços com acúmulo de resíduos. No entanto, seus hábitos são diferentes”, explica Escarlate. Enquanto os ratos frequentemente buscam ambientes fechados e escuros, os pombos se concentram em espaços mais expostos, como edifícios e praças, onde podem se alimentar de restos alimentares deixados pela população.
O problema, segundo os especialistas, não está na biologia do animal, mas na interação que ele tem com o ambiente urbano. Como os pombos se alimentam de resíduos alimentares, eles acabam sendo expostos a locais insalubres, o que pode aumentar a percepção de que são animais sujos. No entanto, isso não significa que, biologicamente, os pombos sejam mais propensos a transmitir doenças do que outras aves ou animais urbanos.
De fato, o contato humano com pombos tem gerado algumas preocupações sanitárias, especialmente no que diz respeito à proliferação de doenças como a psitacose (doença respiratória) e a histoplasmose (infecção fúngica), que podem ser transmitidas por suas fezes quando secas. No entanto, a proliferação dessas doenças está mais associada ao contato direto com fezes ou a inalação de esporos de fungos presentes nos excrementos, do que ao simples fato de observar os animais em espaços públicos.
Em algumas cidades, medidas estão sendo tomadas para controlar a população de pombos e evitar que eles se estabeleçam em áreas como hospitais, escolas e mercados. Isso inclui o uso de redes e dispositivos de controle de nidificação, como espinhos instalados em telhados e parapeitos, e até a introdução de predadores naturais em algumas situações. No entanto, essas abordagens são frequentemente criticadas por ativistas de direitos dos animais, que defendem soluções mais éticas e que não prejudiquem os pombos.
Apesar da imagem negativa que ainda cerca os pombos urbanos, a realidade é que eles desempenham um papel importante na biodiversidade e no ecossistema urbano. Como aves onívoras, eles ajudam a controlar resíduos orgânicos e se tornam parte da rede alimentar de predadores urbanos, como falcões e gaviões. Sua adaptação ao ambiente humano também reflete a resiliência da natureza diante das mudanças causadas pela urbanização.
Assim, a percepção de sujeira associada aos pombos urbanos deve ser repensada, levando em consideração não apenas as condições em que vivem, mas também o papel que desempenham no equilíbrio dos ecossistemas urbanos. Mais do que animais impuros, os pombos são parte integrante da paisagem das cidades e merecem uma abordagem mais equilibrada e informada por parte da sociedade.